Nas
eleições de 2014, concorreram ao cargo de Presidente da República entre os
candidatos favoritos do eleitorado brasileiro, duas mulheres. Isoladamente,
esta ocorrência poderia sugerir que a desigualdade dos direitos de homens e
mulheres no Brasil estaria superada, mesmo porque a Constituição da República Federativa do Brasil é
uma das mais avançadas do mundo no que diz respeito aos direitos civis e
sociais.
Os direitos
individuais, também chamados de direitos humanos e direitos das pessoas, têm fundamentos
no direito natural e em certas liberdades essenciais à personalidade e a
dignidade da pessoa e a Carta Constitucional de 1988, proclama que a sociedade
e o Estado existem para o bem-estar da pessoa humana, assegurando que homens e
mulheres são iguais em direitos e obrigações, não podendo haver qualquer tipo
de discriminação na família, no trabalho nem na sociedade.
No artigo 5º, desta Carta Magna, está
explícito:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e
obrigações, nos termos desta Constituição”.
A
prática, contudo, demonstra que, do mesmo modo que ocorre com relação à
igualdade de oportunidades entre ricos e pobres, negros e brancos, os direitos
iguais entre os gêneros, constituem ainda peça de ficção, desafios a serem
vencidos ou sonhos a serem realizados pela sociedade brasileira.
Breve
reflexão sobre a violência
O conceito de violência é abrangente, mas para a
Organização Mundial de Saúde (OMS) violência pode ser definida como “o uso intencional da força física ou do
poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um
grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha possibilidade de resultar em
lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação”.
A violência contra a mulher, por sua vez, deve ser vista dentro de
um universo muito mais abrangente, relacionada à própria História da humanidade
com a degradação dos relacionamentos intrafamiliares, desenvolvida no quadro da
queda. Portanto, o fenômeno da violência contra a mulher é uma derivação de uma
rede de violência compreendida em um universo bastante abrangente e também
complexo, a violência humana.
Onde existem inúmeros tipos de violência, não só
dirigidos à mulher, mas ao homem, à criança, ao adolescente, ao jovem e ao
idoso. Mas, como historicamente as
maiores vítimas estão entre os segmentos mais vulneráveis, como diz o ditado
popular: “a corda
arrebenta sempre do lado mais fraco”, são diretamente mais atingidas, as mulheres e
crianças. Assim, a violência contra a mulher é fenômeno universal que atinge,
indistintamente, todas as classes sociais, etnias, religiões e culturas,
indiferente aos níveis de desenvolvimento econômico e social.
Segundo reportagem produzida e exibida pelo
Programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, em Edição do dia 29/06/2014 -
Um estudo da ONU (Organização das Nações Unidas), de março deste ano, fez um
ranking dos países muçulmanos que mais desrespeitam os direitos das mulheres. O
Líbano, uma sociedade moderna, convive com costumes medievais, onde as
mulheres, depois do casamento, passam a ser propriedade dos maridos e podem ser
agredidas, presas e até estupradas.
No Egito, segundo a ONU, mais de 27 milhões de mulheres tiveram os órgãos genitais mutilados e no Iraque, mulheres são vendidas e estupradas sem ter a quem recorrer. No Oriente Médio, muitos homens ainda agem como sultões, em um mundo que eles acreditam que mulheres existem para servi-los. São comuns segregação, maus tratos, mutilação de órgãos genitais, estupros, tortura dentro de casa, divórcios desejados pelas mulheres, mas dificilmente alcançados e os conhecidos crimes de honra em que o marido assassino sai praticamente impune.
No Egito, segundo a ONU, mais de 27 milhões de mulheres tiveram os órgãos genitais mutilados e no Iraque, mulheres são vendidas e estupradas sem ter a quem recorrer. No Oriente Médio, muitos homens ainda agem como sultões, em um mundo que eles acreditam que mulheres existem para servi-los. São comuns segregação, maus tratos, mutilação de órgãos genitais, estupros, tortura dentro de casa, divórcios desejados pelas mulheres, mas dificilmente alcançados e os conhecidos crimes de honra em que o marido assassino sai praticamente impune.
"... os direitos iguais entre os gêneros, constituem ainda peça de ficção, desafios a serem vencidos ou sonhos a serem realizados pela sociedade brasileira."
-
“Você, de novo aqui, ainda não comprou um
Pitbul?” Esta é, segundo um instituto de combate à violência contra a
mulher, uma das muitas perguntas dirigidas a mulheres ao tentarem o registro de
ocorrência por maus tratos em algumas delegacias brasileiras. Ironicamente,
este outro tipo de abuso, ocorre no país onde vigora, desde outubro de 2006, a
Lei 11.340, também chamada Maria da Penha, que está colocada em terceiro lugar
no ranking mundial das leis instituídas para o combate à violência contra a
Mulher. E, De acordo com
informações divulgadas pelo Instituto Avante Brasil
(http://institutoavantebrasil.com.br/topicos/mapa-da-violencia-contra-a-mulher/),
uma pesquisa global realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de
35% das mulheres do mundo já experimentaram tanto violência física e/ou sexual
partindo dos parceiros íntimos ou violência sexual de não parceiros.
Um levantamento feito pelo Instituto Avante Brasil
apontou que 40.000 mil mulheres foram vítimas de homicídios no Brasil, entre os
anos 2001 e 2010. Embora muitos avanços
tenham sido alcançados, especialmente depois de 2006 com a Lei Maria da Penha,
estatísticas atuais demonstram que no país são registrados 4,4 assassinatos a
cada 100 mil mulheres, número que coloca o Brasil no 7º lugar no ranking de
países nesse tipo de crime. Mas como diz
uma frase, repetida pelas ondas do rádio em Goiânia neste ano de 2014, como
parte de campanha promovida por uma agência de proteção à mulher: “A
violência contra a mulher faz barulho, mas é o seu silêncio que mais preocupa”.
A
Abordagem Intramuros
Uma novidade na edição deste ano do Acampamento da
Organização Mulheres Cristãs em Ação do Estado de Goiás, realizado no último
mês de maio, foi a inserção do tema Violência contra a Mulher em sua pauta,
tendo o assunto apresentado por uma delegada de polícia, atuante na capital de
Goiás. O ponto alto das discussões sobre o espinhoso e doloroso assunto comoveu
ainda mais pela presença e depoimentos de três vítimas desta modalidade de
violência.
Entre elas estava a goiana Benedita Rodrigues Ferreira,
hoje com 75 anos de idade, que relatou seu drama relacionado à violência doméstica.
Sua narrativa, com clareza nos detalhes, comoveu especialmente porque
corroborado pelo braço esquerdo amputado abaixo do cotovelo pela faca de seu
agressor em um dos muitos episódios de agressão física promovidos contra a
esposa. O crime, que lhe custou parte de um braço e deformou-lhe também uma das
pernas, ocorreu quando ela esperava o oitavo filho do casal, gestante de cinco
meses.
A mulher,
hoje assídua às reuniões da MCA de uma igreja batista em Goiânia, lembrou em
minúcias um drama pessoal, às quase quinhentas mulheres do Acampamento edição
2014 da MCA GO, mas que remete à vida de milhares de mulheres pelo mundo, a
violência doméstica em uma das mais cruéis derivações, a violência contra a
mulher.
Sua história será editada na VM 2T15
Brasil
- Uma Reação
Não é necessário atravessar o Atlântico para se encontrar opressão
e violência contra a mulher. Ela está presente também nas Américas, na América
Latina e especialmente no Brasil, onde tal prática tem deixado marcas profundas
no corpo e na alma de muitas gerações de brasileiras e de brasileiros e de suas
famílias.
Em 2006, foi sancionada pelo Presidente da República e entrou em
vigor, a Lei 11.340, chamada Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para
coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher. O seu
artigo 5º. Define como violência doméstica e familiar contra a mulher,
“qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.
Segundo os três incisos do referido artigo,
essas ações podem ocorrer no âmbito da unidade doméstica, “compreendida como o
espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar,
inclusive as esporadicamente agregadas”; no âmbito da família, definida como a
comunidade formada por indivíduos que são ou consideram aparentados, unidos por
laços naturais, por afinidade ou vontade expressa e em qualquer relação íntima
de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida,
independentemente de coabitação”. A lei penaliza cinco formas de violência
doméstica e familiar contra a mulher: a física, a psicológica, a sexual, a
patrimonial e a moral.
E, a partir
desta lei, atitudes que eram consideradas corriqueiras passam a ser tipificadas
como conduta criminosa, como por exemplo, impedir que a mulher faça uso de
métodos anticoncepcionais, a limitação de seu direito de ir e vir, o insulto e
o controle de suas “ações, crenças, comportamentos e decisões”. Ainda são
passíveis de punição os atos que configurem “retenção, destruição parcial ou
total dos objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores
e direitos ou recursos econômicos da mulher”. A nova lei pune também a calúnia,
a difamação e a injúria.
Depoimentos
de sobreviventes dos crimes tipificados como violência contra a mulher são
pouco comuns. Vítimas, em geral, tornam-se reféns do medo, sucumbem ante ameaças
ou são caladas para sempre. Contudo, tais depoimentos são indispensáveis para se
construir uma análise real do problema, traçar estratégias de combate ao crime e
promover o seu banimento.
"...a violência contra a mulher é fenômeno universal que atinge, indistintamente, todas as classes sociais, etnias, religiões e culturas, indiferente aos níveis de desenvolvimento econômico e social."
A
violência contra a mulher, registrada em B.Os de delegacias especializadas ou
que esporadicamente chega a tribunais, poderia e deveria constituir um problema
distante da realidade da igreja.
Porém, de acordo com a advogada cristã e
delegada de Polícia Márcia Noeli, titular da Delegacia de Mulheres de Nova
Iguaçu, RJ e autora do livro: “Mulheres Corajosas”, em entrevista publicada
pelo site www.clickfamília.com, não são poucos os casos de maridos evangélicos
denunciados por promoverem violência no seio de sua própria família,
principalmente contra suas esposas.
Há
ainda, a existência de uma conduta bem mais frequente do que desejável,
conhecida de lideranças de mulheres em suas agremiações próprias. Algumas destas líderes, esporadicamente, pasmam
ante respostas amarelas como: “Caí na cozinha, irmã”, ou “esbarrei no tanque,
ao esfregar a roupa”, “escorreguei no piso molhado”, ou, “me acidentei na porta
do carro”, quando indagadas sobre a origem de eventuais marcas físicas como
hematomas, olheiras e até membros fraturados.
O
direito da pessoa humana à liberdade é uma das mais caras teologias defendidas
pela Bíblia Sagrada. O mesmo livro traça claramente o perfil do relacionamento entre
homem e mulher em I Cor. 11. 11 e12: “Todavia, nem o homem é sem a mulher, nem
a mulher sem o homem, no Senhor. Porque, como a mulher provém do homem, assim
também o homem provém da mulher, mas tudo vem de Deus”, inclusive dentro da
igreja. Está claro em Gálatas 3.28: “Nisto não há judeu nem grego; não há servo
nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”.
O
apóstolo Paulo recomenda ainda aos salvos, em Colossenses 3.8-11: “Mas agora,
despojai-vos também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência,
das palavras torpes da vossa boca. Não mintais uns aos outros, pois que já vos
despistes do velho homem com os seus feitos. E vos vestistes do novo, que se
renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; Onde não há
grego, nem judeu, circuncisão, nem incircuncisão, bárbaro, cita, servo ou
livre; mas Cristo é tudo, e em todos”.
O
que faz a violência contra a mulher um assunto entre os mais complexos na
atualidade, em qualquer contexto, não é a complexidade em si. É o fato de a
vítima comportar-se também como cúmplice. A postura de suposta discrição,
certamente contribui para a perpetuação da prática criminosa e anticristã, colaborando
para sua consolidação em um mundo já violento demais e infeliz demais, fora das
quatro paredes.
* Texto e imagens publicados originalmente na revista Visão Missionária Ano 93- Número 1- Janeiro a Março de 2015 - 1T15
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