quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

LAR, AMARGO LAR!

Os membros da família juntos, juntavam (redundância proposital) a lenha para a lareira e o vocábulo “lar” originou-se por causa da atmosfera aquecida com o fogo mantido pelo grupo. Com o tempo a lareira virou uma peça da decoração e subsiste graças ao espírito nostálgico e romântico das pessoas. Nos países onde o desenvolvimento tecnológico introduziu aparelhos que aquecem o ar, o trabalho de juntar a lenha para a lareira tornou-se dispensável, do mesmo modo que se perdeu o costume de aconchegar–se uns aos outros para manter a temperatura dos corpos.

No Brasil, o equivalente à lareira é o fogão caipira, que instalado na cozinha, cozia o alimento para a família que se juntava para saborear o porco frito, o cuscuz com leite, o feijão tropeiro, o arroz com pequi, a pamonha e outros quitutes das muitas regiões. E na cozinha, cozinha quente de
“País tropical abençoado por Deus”, e de muita lenha, ao lado do fogão caipira, inventava-se e contava-se as estórias e lendas da imaginativa alma brasileira.

Mas a época do fogão caipira passou também no Brasil, sobrou apenas a churrasqueira e a família passou a freqüentar mais os ambientes frios da casa. A alta concentração de gente nas cidades, a introdução da televisão na rotina do povo, a entrada da mulher no mercado de trabalho e a sofisticação da vida, implementaram uma mudança profunda no comportamento da família brasileira. E esta família, que antes aquecia a alma na atmosfera do fogão caipira, conversando e desenvolvendo a criatividade em suas conjecturas, encolheu-se diante dos monitores. Passou a apenas receber conteúdos, grande parte de qualidade muito questionável à luz de qualquer senso mediano.

E, as estatísticas que apontam os problemas adquiridos pela ausência de diálogo nos frios lares brasileiros, são de gelar o coração e a frieza com que a sociedade lida com a questão é de dar calafrios.

É incontestável a praticidade e o conforto proporcionados pela tecnologia nas casas modernas. Mas uma inscrição exibida em paredes de muitas delas, no charme da língua inglesa ou em bom português, soa como uma grande ironia: “Lar, Doce Lar!”. Em casas onde familiares se relacionam como torcedores, eleitores e jogadores não há nada de doce nem de lar. O que não mudou desde os tempos da lareira é que família e lar dependem do esforço de cada membro do grupo em todas as etapas do aquecimento, mesmo no crepitar dos espinhos. Com a participação de cada um nesta construção, as cozinhas tecnológicas de nossos dias seriam mais aconchegantes, os corações mais aquecidos e as ante-salas dos consultórios médicos, menos congestionadas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada por ter vindo!