terça-feira, 20 de março de 2012

ENTREVISTA- ODETE DÁRIS CORDEIRO

“A União Feminina Missionária é uma grande e estruturada Organização, com uma linda história para contar em seus mais de 100 anos de Brasil”


Odete Pereira Dáris Cordeiro nasceu em Corrente (PI) em uma família evangélica. Chegou à PIB em Goiânia, onde é membro, com seis meses de idade. Nesta igreja passou a infância, adolescência e parte da juventude. Aos seis anos, relatou à professora de EBD chamada Carolina Moreira que aprendera a ler e ganhou da mesma um exemplar da Bíblia.  Tomou gosto pela leitura do Livro Sagrado e converteu-se aos quinze anos de idade. Ainda moça, aprovada em concurso, transferiu-se para Brasília (DF). Na Capital Federal conheceu um rapaz que veio a ser o Pr. José Cordeiro Valdecy, com quem se casou e teve seus dois filhos, José Natal Dáris Cordeiro e José Henrique Dáris Cordeiro. É Graduada em História (UFG), Pedagogia (UNB) e Educação Cristã (Faculdade Teológica Batista de Brasília). Presidiu a UFMB-GO por vários mandatos atuando também como Coordenadora Geral da MCA da Primeira Igreja Batista em Goiânia.
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1-Onde e como se deu o seu primeiro contato com a União Feminina Missionária?
Meu primeiro contato com a União Feminina Missionária Batista aconteceu em uma época longa de horror em minha vida, que preciso contar em ‘três atos’.

Primeiro: No dia 24 de Outubro do ano de 1963, eu estava na última semana de gravidez de meu primeiro filho. Naquele dia eu tinha uma prova na UNB, onde cursava Pedagogia e uma consulta médica à tarde. Meu marido, que era contador, retornaria ao lar para o almoço e me conduziria aos dois compromissos.  Não compareceu à hora combinada, preocupei-me. Ao olhar pela janela do apartamento onde morávamos, vi seu carro estacionado próximo à entrada do prédio. Desci e fui informada de que ele fora levado por um carro preto conduzido por dois militares a um lugar não informado. Parti em sua busca, mas havia silêncio sobre seu paradeiro. E a angústia crescia ao ponto de quase explodir. À época freqüentávamos uma igreja em um bairro distante por não identificar o templo próximo de casa como uma igreja batista, já que era pouco convencional ostentando uma cruz na fachada. Muito angustiada, sentindo medo e solidão, notei que os hinos cantados eram os mesmos de nossa igreja. Decidi ir àquele templo, que distava a poucos quarteirões de casa. Adentrei e sentei-me no último banco. Enquanto ministravam, chorei copiosamente. Ao final da reunião, as senhoras daquele grupo me abraçaram e me acolheram bondosa e carinhosamente. Eram da União Feminina Missionária. Daquele dia em diante, o grupo e o pastor da igreja e a esposa, casal Pr. Alfon Kruklis (leto) com a esposa Norma Kruklis (alemã), passaram a freqüentar minha casa e a me dar apoio até a localização do meu esposo em uma prisão militar, onde permaneceria  nos próximos quatro anos como preso político da Ditadura Militar.

Segundo: Meu marido foi preso político durante a ditadura militar por ter integrado o chamado Levante dos Sargentos, que foi uma reação contra o que viria a ser o Golpe Militar que se concretizou em 1964.  Meses depois, quando já localizara meu esposo numa prisão militar e tentava retomar minha vida como pai e mãe da casa, já com um bebê pequenino no colo, fui sacudida novamente por outro episódio. Tive a casa invadida por militares com a alegação de que eu deveria viajar a Cuba por determinação do Governo do Brasil para aplacar um seqüestrador que tomara um avião e o mantinha na Base Aérea de Brasília.  Fui conduzida, juntamente com o filho bebezinho, uma sobrinha e uma irmã por policiais militares para aquele lugar, informada apenas de que deveria intermediar uma negociação com o seqüestrador que ameaçava explodir o avião com mais de cem reféns. Entregaram-me um megafone, através do qual eu deveria demover o criminoso de tal intento. O que acabou acontecendo. Fui usada pelo regime militar e novamente obrigada a participar de algo que não me dizia qualquer respeito, à custa de muitos danos emocionais a mim e à parte de minha família que ainda restava comigo. Por viver tudo isso, adquiri a Síndrome do Pânico e precisei de muita ajuda profissional mais tarde.

Terceiro: Neste período, sobretudo, a Primeira Igreja Batista do Guará e seu amor e cuidado para comigo foram indescritíveis.  E os laços que foram estabelecidos de sólida amizade e amor cristãos são uma coisa para toda a vida, tanto para com a igreja como para com a União Feminina. Acredito que vivenciávamos algo parecido com o que foi a igreja primitiva. Por morar perto da igreja minha casa era um ponto onde as pessoas afluíam naturalmente e estabelecíamos e aprofundávamos a amizade. Os amigos que fizemos naquela época tornaram-se para toda a vida, inclusive para meus filhos. Lá me integrei ao trabalho, notadamente junto às mulheres, entre as quais fui presidente por alguns mandatos. A União Feminina da Igreja Batista do Guará possuía um veículo do tipo Van (Kombi) e mantinha um ponto de pregação no Setor Gráfico, uma região que depois foi saneada. Aquela igreja foi transferida para o que é atualmente a Igreja Batista de Samambaia (DF). Assim, na União Feminina eu encontrei o apoio e o amparo emocional e espiritual que eu tanto precisava em um momento limite de minha vida. E, desde então e certamente por esta razão, afeiçoei-me profundamente ao trabalho cristão da União Feminina Missionária Batista.


2- Em sua opinião o que mudou na Organização nos últimos 38 anos, período em que esteve envolvida?
Acredito que o trabalho feminino nas igrejas retraiu-se no que diz respeito ao envolvimento com o evangelismo, se comparado ao estilo da época e do contexto que o conheci, no início de meu envolvimento com esta Organização.

3-Você acha que este movimento foi um reflexo do que ocorreu com a própria igreja?
Acho que isso não é um fato isolado.  O trabalho feminino acompanhou o movimento da própria igreja como um todo. Por outro lado, acredito que as diferenças regionais e culturais também influenciam no modelo do trabalho.  Contudo, noto que cada igreja tem um perfil de trabalho feminino. O contexto atual é diferente do de três décadas e as igrejas também o são.  Por exemplo, no Arizona (EUA), onde também fiz parte da Organização de mulheres alguns anos depois de Brasília, o mesmo caracteriza-se por uma marcante atenção em Ação Social. Isto se explica na história da igreja lá. Contam que um pastor que por lá passou há muitos anos atrás, teve a visão de adquirir a propriedade para o templo próxima ao edifício onde funciona a renomada Universidade agrícola do Arizona, para onde acorrem imigrantes estrangeiros oriundos de diversas partes do mundo. Mais tarde, o templo foi encampado pela Universidade e grande parte do trabalho feminino é voltado para o atendimento a este contingente nas dependências do “Bill Center”. Lá, é natural ao horário da sesta (descanso de após o almoço) encontrarmos nas dependências da igreja, contígua à escola, os estudantes recostados para o descanso. Os estudantes interagem com a igreja e dela recebem atenção e cuidados, tais como cortes de cabelo, etc. Em Brasília, no início da implantação da Capital Federal, a igreja militava enfatizando o evangelismo também visando as pessoas que para lá acorriam de outras regiões do país. Havia espaço para visitação e evangelismo. Aqui em Goiânia, por exemplo, na PIB, acho que a Organização volta-se mais para o psicológico e emocional cuidando do atendimento interno, inclusive trabalhando de modo natural e espontâneo na formação de liderança. Outro fator que acho relevante ao considerar qualquer modelo de Organização Feminina é a faixa etária envolvida com o mesmo. Isto só, já delineia muitas das atividades que serão desenvolvidas pelo grupo naquela igreja ou localidade.

4-Que perspectivas vê para o trabalho da União Feminina em Goiás, que em 2011 completou 72 anos de Organização?
Vejo que a UFMB está sendo descaracterizada em muitos lugares. Há igrejas em que foi mesmo suspensa ou extinta. Mas não se é de surpreender porque mesmo a EBD está sofrendo muita resistência e algumas igrejas já a suprimiram. Muitas vezes as reuniões da própria MCA desprendem-se do caráter missionário e tornam-se mais reuniões sociais. Vejo como um sério risco à sua continuação. Infelizmente penso que a doença do imediatismo chegou aos nossos arraiais. Temos trabalhado muito em cima do improviso e do não planejamento. O resultado é a baixa qualidade do serviço, a descontinuidade e por fim a desmotivação. E esta é contagiante. Temos uma sociedade bastante exigente e a igreja deveria oferecer um serviço diferenciado e atrativo. O que certamente não será conseguido no improviso nem na descontinuidade. Precisamos de boas ferramentas e muito compromisso e empenho.

5- Que mensagem deixaria às mulheres cristãs envolvidas com a União Feminina Missionária e qual deixaria às que ainda não se envolveram com a Organização?
O que eu gostaria de falar é que permaneçamos firmes no propósito de servir a Deus, trabalhando com a família, orando pelas famílias e filhos. Nós nos reunimos com boa intenção, estamos trabalhando para sermos melhores aprimorando nosso serviço. O tempo muda e nós temos que aceitar a sua dinâmica. Procuro não ser uma pessoa bitolada. Tenho procurado usar as ferramentas tecnológicas de que dispomos como computador, vídeos e internet para melhorar nosso desempenho com o cuidado de não perder o foco, o crescimento espiritual.  Não somos obrigadas a participar de tudo o que a igreja faz porque a gama de ministérios é imensa, mas precisamos escolher algumas áreas onde podemos nos doar, dar o melhor de nós. Somos parte do que a igreja está fazendo e, portanto, devemos nos inserir, nos envolver. Todas as mulheres da igreja são parte da União Feminina e devem se sentir assim, inseridas, frutificando, cooperando. Às que ainda não participam das atividades desta Organização não é necessário fazer-lhes um convite especial. Todas são participantes naturais desta Organização. O ministério com Mulheres é um dos vários ministérios da igreja, com atribuições e características peculiares e certamente o serviço de cada uma fará uma grande diferença para a igreja como um todo. Mas penso que trabalhar com este ministério será mais positivo ainda para cada qual, particularmente. Porque a União Feminina Missionária é uma grande e estruturada Organização com uma linda história para contar em seus mais de 100 anos de Brasil.
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