terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A FAMÍLIA E A VONTADE DE DEUS - PR. FERNANDO LEITE



ENTREVISTA

“A solução para a família está, em pôr a vida dentro da vontade boa, perfeita e agradável de Deus”


O Pastor Fernando Leite tem um ministério de 27 anos. É casado há mais de duas décadas e meia e pai de dois filhos. Tem formação teológica pelo Seminário Palavra da Vida, onde fez graduação e pós-graduação em Antigo Testamento. Trabalha a 23 anos na Igreja Batista Cidade Universitária, Campinas-SP. Tem dois livros publicados, sendo um na área de Provérbios e o outro sobre os 15 primeiros Salmos. Nos dias 22, 23 e 24 de junho de 2007 atuou como preletor no Congresso da Família promovido pela Primeira Igreja Batista em Goiânia, que neste ano, refletiu sobre o tema: A Busca pela Santidade.


A Bíblia narra a constituição da primeira família na Terra. A seu ver, a mesma serviria de modelo para as demais que viriam depois?
Pr. Fernando Leite- A primeira família da Terra não. Ela serve para uma compreensão daquilo que foi planejado e proposto por Deus. Em Gênesis capítulo 1, apartir do verso 26 e Gênesis capítulo 2, nós vamos perceber quais eram os ideais de Deus para a família. Dentro desse projeto da primeira família a gente identifica princípios que valem para a família de hoje, entretanto, Gênesis capítulo 3 relata a queda e conseqüentemente o fiasco da família. Nós não vemos na conduta da família daqueles dias qualquer coisa que devesse ser reproduzida. Ela foi projetada para o melhor, mas escolheu o pior. Mas no capítulo 3, do mesmo livro, existe uma promessa objetiva de que Deus enviaria o resgatador e foi no contexto da família, filho de uma mulher, que nasceu o Messias.

O que podemos reter de positivo nas famílias dos patriarcas da fé, começando pela de Abraão, passando pela de Isaque e indo até Jacó?
Pr. Fernando Leite- Neste momento não consigo me recordar de muitas coisas positivas na vida familiar deles. As Escrituras chegam a relatar alguma coisa, por exemplo, em I Pedro no capítulo 3 que fala do exemplo de Sara, da maneira como ela tratou seu marido, mas eu diria que, em geral, eu vejo na vida dos patriarcas, no campo do relacionamento conjugal, primeiramente um padrão cultural muito diferente do nosso e em segundo lugar, uma característica das Escrituras, que trata muito do fiasco, do fracasso que eles foram. Então, apresenta exemplos negativos que podem estar presentes na vida de homens de Deus. Abraão mentiu expondo a segurança de sua esposa. É um exemplo para ser evitado. Ele não foi elogiado por tal coisa. Eu diria a você que não encontro muitos aspectos positivos na conduta familiar de Abraão, ou de Isaque ou de Jacó. Nós vamos encontrar mais orientações sobre o relacionamento conjugal no Novo Testamento.


O tema do Congresso da Família na Primeira Igreja Batista em Goiânia neste ano de 2007 é: A Busca pela Santidade. Como o senhor analisa tal relação, digo, entre Família e Santidade?
Pr. Fernando Leite-No primeiro dia do Congresso, eu disse que a santidade não é uma característica específica. Santidade é como se fosse um guarda-chuva que contempla as demais características. Quando as Escrituras falam de santidade no contexto, no ambiente da família, isso significa que tal família deve ter padrões, estilo de vida, conduta, diferenciados dos padrões do mundo. A santidade é, portanto, quando o meu jeito de ser, de viver, de tratar e de relacionar deixa de ser o da sociedade e passa a ser de acordo com os padrões de Deus. Esse Deus que me salvou tem princípios que também devem estar presentes no relacionamento conjugal. A santidade se relaciona com família justamente neste aspecto, quando esta família não segue os padrões da sociedade e, para tal família, as orientações de Deus são claras.

O senhor não adotou a linha do discurso arrebatador de multidões para falar à Igreja como é comum em tais ocasiões, e ao contrário de enumerar as “bênçãos” de sua vida pessoal, expôs o lado da fraqueza humana, narrando episódios de conflitos que vivencia em sua experiência de busca pela santidade. A que atribui então, a atenção quase total da platéia no plenário?
Pr. Fernando Leite- Eu acho que é um perigo as pessoas pregarem só suas experiências de sucesso. A gente comunica a mentira de que a nossa vida é só sucesso e a gente comunica outra mentira, a de que os princípios de Deus são só para os bem sucedidos. Na verdade, todos nós, sem nenhuma exceção, somos pecadores miseráveis, que dependemos da graça e da sabedoria e do poder do alto para sermos alguma coisa. Todo mundo está nesta condição. Eu diria que qualquer pregador que “pinte” um auto-retrato triunfalista se divorcia da verdade. Precisamos ser muito claros em expressar que a glória não é pessoal, a glória é da graça, da misericórdia, da compaixão e da sabedoria que vêm de Deus. Eu não sou o sucesso. O sucesso é o que Deus é capaz de fazer em nossas vidas. A identificação com o povo, além de ser um ato de sinceridade é a maneira de comunicar a todas as pessoas que o Evangelho é, como de fato é, para as pessoas comuns, como eu sou. Aliás isso não é um artifício de comunicação, é uma retratação de realidade. Por isso eu sou contra a idéia de se pregar uma mensagem triunfalista. Tenho sucessos e fracassos em minha vida pessoal, em minha vida conjugal e em minha vida ministerial. Isso é parte de nós. Isso é parte de qualquer um.

Essa é a linha adotada por grande parte dos pregadores da atualidade. Não é?
Pr. Fernando Leite- É. Fico contente de que eu terei que responder diante de Deus só por mim mesmo.

O senhor propõe que a santidade de que fala a Bíblia é um estilo de vida e que o culto racional, mencionado pelo apóstolo Paulo, é, em última instância, obedecer a Deus afirmando que isso é o rompimento com os padrões de nossa sociedade. Sugere que a Igreja deve andar na contramão da História?
Pr. Fernando Leite- Eu não diria que a gente deve viver na contramão da História, mas que o mundo não serve de referência para nós, nem naquilo que devemos fazer nem no que devemos deixar de fazer. Quem é referência para nós é Deus e a sua Palavra. Eu diria que deveríamos ser o povo que escreve a História, como sal e como luz. Se em minha vida pessoal e familiar eu vivo os princípios de Deus, eu dou valor às Escrituras, à revelação e pela graça e pelo poder de Deus eu manifesto isso, na minha conduta e na minha palavra. Assim, eu acabo afetando o meu vizinho e o meu colega, que se torna desejoso de conhecer mais este Deus, de sua graça e de sua orientação. Assim, eu quero ser parte dos que escrevem a História, a História de Deus que transforma vidas.

Há hoje, no mundo ocidental, movimentos pró- formação de núcleos familiares bastante diversificados, como a chamada produção independente e a adoção de filhos por parceiros homosexuais. Como o senhor analisa tal fenômeno social à luz da Palavra de Deus?
Pr. Fernando Leite-Quando Paulo escreveu em Romanos, capítulo I, ele falou sobre o processo de decadência da sociedade, ele chega ao último estágio e afirma que, por conta da rebeldia e da glorificação que o homem deu ao próprio homem, em vez de a Deus, Deus nos deixou chegar ao que é mais reprovável. A nossa sociedade está retratada pelo Senhor Jesus Cristo, quando afirma: ‘o mundo inteiro jaz no maligno’. Está longe do Senhor, cada vez mais rebelde, violenta, imoral e corrupta e cada vez pior, como um reflexo do rompimento com Deus. A sociedade humana, no campo moral, tem ciclos de melhora e de piora. Há momentos em que ela tem mais tolerância com uma conduta perversa e assimila mais, mas em outro momento, ela mesma se cansa, se enoja e se volta para alguns valores, por não agüentar mais seu próprio estado de caos. Nós estamos vivendo no Brasil, um processo de decadência tremenda, com o liberalismo em todos os níveis. Enquanto nós estivermos nesta ‘ladeira abaixo’ , longe dos princípios de Deus, nós vamos ver cada vez mais nossa sociedade podre, fétida e carente da misericórdia do Senhor. As Escrituras revelam que esse movimento liberal, de queda moral tão violenta, pelo rompimento com Deus, colherá os seus frutos.


A Idade Média esboçou uma reação a um tipo de “ladeira abaixo” semelhante, que marcou a História humana negativamente. Como promover uma reação diferente?
Pr. Fernando Leite-Vida com Deus e testemunho diante do povo. É a única transformação genuína. Não existe Lei. Não existe policiamento. O que existe é um povo sendo unção. Entendo como válido ainda, o conceito de sal empregado nos tempos antigos: uma pedrinha que pastores que trabalhavam no campo chupavam com dois propósitos: primeiro, o de sentirem sede para beberem água e não entrarem no processo de desidratação e segundo, estimular a retenção de líquido no corpo. A Igreja precisa estar tão comprometida com Deus, viver tão dentro de sua vontade, ao ponto de provocar nesta sociedade onde está inserida, sede por conhecer mais a vontade dele. Não tem outro caminho.

Para isso a Igreja possivelmente adotaria posturas que a tornariam impopular. Não ?
Pr. Fernando Leite- É o que o Senhor Jesus disse sobre a necessidade de pregarmos a Palavra de Deus e segundo Paulo, quer aceita quer não. Nosso compromisso é entregarmos sua mensagem, não nos amoldarmos. Não podemos ceder. Temos de manter a verdade. A verdade permanece. Se cedermos estamos sendo infiéis a Deus.

O senhor concorda que em algum momento a Igreja terá que construir uma História paralela?
Pr. Fernando Leite- Eu acho que a Igreja já a vem construindo. Sempre que adota uma conduta diferente da sociedade onde está inserida, no meio da massa onde deve salgar. Não pode estar à parte, mas no meio, influenciando. De certa forma nos assusta o nível de imoralidade em nossos dias, mas com segurança, nos dias do apóstolo Paulo, no ambiente pagão, a imoralidade era muito maior do que é hoje no nosso Brasil. Houve uma igreja na cidade de Éfeso e outra na de Corinto onde a promiscuidade nos relacionamentos, tanto entre mulher e homem, quanto homosexuais, foram mais intensos do que aqui, ao ponto de Paulo dizer em I Coríntios capítulo 6, versos 10 e 11: “Tais fostes alguns de vós, mas foram regenerados, lavados, santificados”. Deus salva pessoas nestas condições.

Mesmo uma pessoa estando na imoralidade, Deus tem uma solução para ela, não é? E para a corrupção que avassala nosso País, existe proposta?
Pr. Fernando Leite-Não creio numa outra alternativa que não seja a graça de Deus e a salvação. Há dois anos estive no Rio de Janeiro com um juiz e havia tiroteios em algumas regiões da cidade, não tão violentos como os de hoje, mas já existiam. Então perguntei a ele quando é que tal violência iria acabar e ele me respondeu: “Eu esperava que você, como homem de Deus, me dissesse qual será o fim desta história”. Eu sei que ainda não chegamos ao final, mas tenho certeza de que esta sociedade não passará por qualquer mudança por decisão governamental ou de qualquer instituição. Ela só vai mudar, se efetivamente, as pessoas nela inseridas, tiverem uma experiência genuína com Deus. Tal como um sociólogo inglês disse, recentemente: “O único caminho seguro para alguém sair do tráfico de drogas é pela conversão ao Senhor Jesus Cristo”. Esta é a resposta. Sempre foi e sempre será.

Qual o perfil da família no ocidente? Que diferença apresenta em relação à família cristã e o que esta precisa fazer para ser santa aos moldes da vontade de Deus, no contexto em que sobrevive?
Pr. Fernando Leite- Eu acho que vai variar bastante quando a gente pensa em ocidente se considerarmos ainda alguns conceitos e a situação econômica e cultural. A situação da família na Espanha, por exemplo, é bem diferente da família na Itália hoje.

Vamos nos restringir, então, à família da América Latina.
Pr. Fernando Leite-Eu creio que esta é, de uma forma geral, uma família muito machista. Algumas vezes, até no meio evangélico há uma suposta defesa de seu machismo. Eu vejo uma família que conhece pouco dos princípios de Deus, isso no contexto da Igreja. Fora dela, menos ainda. Uma família frustrada. Na cidade de onde eu venho, mais de um terço dos casamentos são dissolvidos no primeiro ano de casados. Essa visão ímpia de viver à parte de Deus tem sido reproduzida no âmbito da família. Estou abismado, abismado sobre o quanto o divórcio é comum hoje. Deus tratou dele. A família se encontra num caos, porque o homem dentro dela, se encontra no caos.

Como é possível, então, à família cristã atual, ser santa aos moldes da vontade de Deus, dentro de tal realidade?
Pr. Fernando Leite- Acho que os salmos 127 e 128 são uma base para isso. Como é feliz o homem que teme ao Senhor! O texto fala da relação deste homem com sua esposa, com seus filhos, depois da emancipação de seus filhos e a bênção que estes acabam sendo para a sua cidade e para seu país, no caso para Sião, Jerusalém e Israel. O início da transformação de uma família começa no temor do Senhor. Isso significa levar Deus a sério. A pessoa busca nesse Deus conhecimento de como tratar, como administrar e como se conduzir em família. E, na medida em que busca a Deus, aquilo que não tem em si mesmo e começa a colocar em prática as suas recomendações, esta pessoa está investindo para que sua família seja feliz. É lógico que, quando os dois cônjuges se dispõem a fazer isso conjuntamente, empreende-se muito mais velocidade e potencialidade para se alcançar o ideal de felicidade familiar. Porém, não poucas vezes eu tenho visto apenas um começar uma jornada solitária de busca de Deus e, mesmo que ao longo do tempo, a maior parte deles, têm conseguido transformar positivamente suas famílias. Assim, tudo começa no temor do Senhor, no levar Deus a sério, sua visão, suas considerações e sua instrução, reveladas nas Escrituras. Podemos dispor também de literatura e aprender com outros homens, que têm estudado princípios que devem reger o relacionamento familiar e então, colocá-los em prática pela graça de Deus. A solução para a família está, portanto, em pôr a vida dentro da vontade boa, perfeita e agradável de Deus.
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